Repositório RCAAP
Africanidade: morte e ancestralidade em Ponciá Vicêncio e Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra
O presente estudo analisa, numa perspectiva comparativa, as narrativas Ponciá Vicêncio, de Conceição Evaristo e Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra de Mia Couto( António Emílio Leite Couto). A hipótese principal da pesquisa é a de que nos textos, cada qual ao seu modo, e compreendidos na esteira das produções culturais da diáspora negra, a morte e ancestralidade, motivos de nossas análises, figuram como temas emergentes de um contexto de ação transnacional da diáspora negra de tal modo que evidenciam as relações conflituosas e encenam os desejos utópicos dos racialmente sujeitados pela modernidade que voluntariamente adulteram, inclusive, os modos de representação literários. Para que se tornasse possível a realização do estudo contamos com os subsídios dos seguintes autores: Stuart Hall, Paul Gilroy, e Èdouard Glissant.
2010
Adriana de Cássia Moreira
Das invasões às fogueiras: os discursos excêntricos em Saramago e Pepetela.
Os romances Memorial do Convento, de José Saramago, e A gloriosa família: o tempo dos flamengos, de Pepetela, são considerados como novos romances históricos, cuja forma tem origem tanto na estrutura do romance histórico de matriz realista, teorizado por Lukács, quanto nos primeiros novos romances históricos criados em Cuba, por Alejo Carpentier, a partir de 1949, consideradas suas singulares diferenças em relação aos contextos de origem, pois confirmam diálogos com certos elementos da tradição dos romances produzidos em cada um de seus sistemas literários. Assim, por pertencerem a um subgênero que estabelece uma ruptura com o paradigma dos romances históricos produzidos no momento do Romantismo e do Realismo, essa nova forma apresenta características próprias, cujos discursos projetam tanto as ideologias dominantes de época quanto outras formas de pensamento, as quais asseguram um contradiscurso que percorre os textos, como enunciados secundários, articulados a partir de discursos primários. Os posicionamentos enunciativos, bem como a configuração de seus narradores revelam lugares sociais considerados excêntricos, assim como os discursos que veiculam em relação à história oficial, à qual procuram tanto parafrasear, estilizar quanto parodiar. E, algumas vezes, lidam com apropriações do texto histórico canônico, exatamente com o objetivo de subverter o sentido dessa escrita como um discurso bem sucedido das elites do tempo histórico-diegético, privilegiando a visão dos narradores e das personagens excêntricos. Dessa maneira, os discursos excêntricos possuem algumas temáticas que se alinham à história percebida como pesadelo, enfatizadas em ambos os romances e desveladas pelos implícitos e inferências, como a crítica aos Impérios e seus valores; crítica ao Monopólio e suas dinâmicas; à dominação de outros povos e grupos por meio da força bruta; ao caos existencial gerado pelas elites sobre as dinâmicas sócio-culturais dos grupos submetidos; à ideologia monódica, em confronto com outras formas culturais; aos prejuízos materiais e emocionais impostos pelas elites às classes subalternas: às desigualdades sociais como geradoras de exclusões, entre outras. Trazem implícitos, também, os discursos sobre a formação de identidades singulares pela constante mestiçagem ou pela exclusão racial ou social.
2010
Rosangela Manhas Mantolvani
Eugénio Tavares: retratos de Cabo Verde em prosa e poesia.
A leitura comparativa das produções em prosa e poesia que compõem a obra literária de Eugénio Tavares possibilita a compreensão da importância da participação dos escritores nativistas para a construção da nação Cabo Verde, da sua cultura e para a formação de sua série literária. Buscaremos nas produções jornalística e epistolar eugenianas traçar um panorama do contexto cabo-verdiano da virada do século dezenove para o vinte, destacando-lhes o propósito de denúncia das principais questões sociais, econômicas e políticas, assim como as aspirações libertárias que preocupavam os intelectuais cabo-verdianos da época. Na poesia, que ora se expressa em língua portuguesa, ora nas mornas em língua cabo-verdiana (crioulo), daremos ênfase a aspectos que fazem confluir a arte eugeniana para um ultrarromantismo tardio, de raiz lusa e, ao mesmo tempo, a estratégias que rasuram este estilo a partir de dentro, por meio de artifícios como a crítica e o humor carnavalizador. Quanto à morna, documento de registro da consciência coletiva, recorte de um patrimônio histórico, cultural e humanístico, submetida à mestria da pena de Eugénio Tavares, constituirá, além de uma marca identitária crioula, um dos marcos do lirismo literário cabo-verdiano. A opção de trabalhar com o cotejo de textos de diferentes gêneros manifesta a nossa tentativa de captar a riqueza com que Eugénio Tavares se apresenta e representa Cabo Verde em sua obra.
2010
Genivaldo Rodrigues Sobrinho
Emília, João sem medo e Marianinho: vozes críticas na literatura para juventude - Literatura e consciência social
Através da análise de obras de Literaturas de três países que falam a Língua Portuguesa (Brasil, Portugal e Moçambique), este trabalho tem como objetivo estudar a importância da Literatura na formação individual e social dos jovens, cujos temas estão inseridos no contexto histórico, sociopolítico e cultural. As obras selecionadas para o estudo são: A Chave do Tamanho, de Monteiro Lobato (Brasil); Aventuras de João Sem Medo, de José Gomes Ferreira (Portugal) e Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra, de Mia Couto (Moçambique). Três livros que, atentos à realidade social e apoiados em eventos históricos, (a Segunda Guerra Mundial, o Estado Novo de António Salazar e o pósindependência/ guerra civil de Moçambique), apresentam matéria literária sustentada no universo maravilhoso para discutir os momentos dos quais os autores foram testemunhas, propondo reflexões críticas para expressar visões de mundo transformadoras da realidade; leituras, que, além do prazer e emoção estéticos, contribuem na formação da consciência social e crítica do leitor/receptor.
2009
Rosane Aparecida da Silva
Por linhas e palavras: o projeto gráfico do livro infantil contemporâneo em Portugal e no Brasil
O trabalho que se apresenta tem por objetivo investigar a composição gráfica dos livros infantis. O corpus da pesquisa compreende as décadas de 1980 e 1990 e os primeiros anos do século XXI, em Portugal e no Brasil, a partir da seleção dos autores Manuela Bacelar (Portugal) e Roger Mello (Brasil). A escolha do corpus se justifica, pois ambos são, inicialmente, ilustradores para, em seguida, tornarem-se autores com dupla vocação, isto é, produtores de textos verbais e visuais. Além dessa característica, ambos desenvolveram uma produção literária voltada ao público infantil em que impera a diversidade de estratégias e relações entre sistemas semióticos, por exemplo: autores de livros de imagens, autoresilustradores de livros ilustrados e autores de livros-álbum. Essa última modalidade, em que há a integração dos textos verbal e visual, está no centro das discussões. A reflexão sobre o desenvolvimento desse gênero de texto à luz da Semiótica discursiva de linha francesa, a qual também fundamentará todas análises realizadas, compõe o primeiro capítulo deste trabalho de tese. Em seguida, abremse as portas para os livros infantis portugueses e o desenvolvimento do livro-álbum em Portugal, bem como serão realizadas análises minuciosas de três obras de Manuela Bacelar, a saber: O dinossauro (1990), A sereiazinha (1995) e Sebastião (2004). Cada uma das obras será abordada tendo em vista as diferentes relações entre palavra e imagem e a composição final em um projeto gráfico que deveria constituir um todo de sentido. Assim, as obras se diferenciam, pois O dinossauro é um livro-álbum, em que Bacelar é autora de dupla vocação; A sereiazinha é um livro-ilustrado, em que a autora portuguesa ilustra o clássico de Hans Christian Andersen e Sebastião exemplifica aquele gênero, em que, por meio de imagens, a artista plástica conta a história. No terceiro capítulo, o contexto brasileiro é colocado em foco e surge o trabalho em equipe, ou seja, uma equipe de profissionais é formada para criar o objeto-livro, e essa transforma-se em uma característica fundamental para a história do gênero livro-álbum no Brasil. Roger Mello é um autor bastante representativo dessa corrente artística e suas obras eleitas para análise se destacam pela produção em equipe e pela constituição de diferentes relações (ou grau de relações) entre palavra e imagem na composição do projeto gráfico. As seguintes obras serão analisadas com mais atenção: Jardins (2001) e Desertos (2006), texto verbal de Roseana Murray; Fita verde no cabelo: nova velha história (1992), em que Mello ilustra o conto de Guimarães Rosa e Vizinho, vizinha (2002), obra composta por uma equipe formada pelos artistas Mariana Massarani, Graça Lima e Roger Mello, e o último assina como autor do texto verbal. Finalmente, no quarto capítulo, é possível fazer um paralelo entre o contexto do livro-álbum e suas características nos cenários português e brasileiro, chegando a algumas invariantes, como a tendência ao traço pictórico em Portugal e ao grafismo no Brasil. Com isso, a partir de dois contextos particulares, vislumbra-se a importância do livro-álbum como um gênero cada vez mais presente no panorama da Literatura Infantil
Kazuo Wakabayashi: vida e obra de um artista imigrante
As produções artísticas do pintor Kazuo Wakabayshi podem ser divididas em duas etapas. A primeira é um conjunto de obras de tonalidade escura, de tom universal e sem qualquer indicação de sua origem étnica. A segunda fase, que se inicia por volta dos anos de 1980, consiste em obras de cores vibrantes, cujo detalhe apresenta elementos da cultura japonesa, tais como personagens do teatro kabuki, estampas da indumentária tradicional e outros elementos pertinentes àquela cultura. Apesar das notáveis diferenças entre as duas etapas, a elipse é a forma geométrica que sempre existiu na vida artística de Wakabayashi. O propósito da presente tese é trazer à tona o que está imerso nessas criações, primeiramente de natureza universal e, posteriormente, identitária. Acredito que a compreensão da arte desse artista imigrante poderá trazer respostas acerca da história de sua vida
A cidade e as serras, a ironia e o fin-de-siècle
Neste trabalho, iremos analisar o livro A cidade e as serras, de Eça de Queirós, mediante os discursos referentes às estéticas de fin-de-siècle, que se estabelecem na França entre os anos de 1880 e 1900. Tentaremos observar, como o autor aproveita-se dos discursos para construir a personagem de Jacinto e como os manipula ironicamente a fim de estabelecer sua visão crítica sobre o período. Além disso, pretendemos mostrar como Eça de Queirós observa a mudança de perspectiva que acontece no campo cultural francês, ou ainda, no mundo no fim do século XIX, isto é, de um ponto de vista positivista, passando pelo decadente e pessimist, para o idealista. Acreditamos que através da manipulação irônica desse quadro histórico e do horizonte discursivo e estético que constitui o imaginário do homem do fim do século, Eça de Queirós irá estabelecer uma versão mais refinada do realismo praticada em seus livros da última fase
José Luandino Vieira: Mémorias e guerras entrelaçadas com a escrita
Esta tese de doutorado, intitulada José Luandino Vieira: memória e guerras entrelaçadas com a escrita, propõe a leitura de três romances: Nós, os do Makulusu (1975), O livro dos rios (2006) e O livro dos guerrilheiros (2009), do angolano Luandino Vieira. As três narrativas produzidas nos fins do século XX e nos primeiros anos do século XXI encenam as transformações vivenciadas a partir do processo de colonização (guerra de libertação/independência de Angola), bem como o entrecruzamento da História/ficção (na apropriação e interpretação do passado), da memória e da escrita (individual e/ou coletiva) decorrentes desse momento. Portanto, através de uma leitura baseada nos pressupostos da literatura comparada, procuramos analisar a relação entre os três romances. Desse modo, esperamos mostrar como a ficcionalização da guerra de libertação evidencia as fissuras, perplexidades e profundas contradições internas de um país que viveu guerras sucessivas que só terminaram no ano de 2002, portanto em pleno século XXI
Duas faces da malandragem: a figura do malandro nos contos \"A volta do marido pródigo\", de Guimarães Rosa, e \"Paulinho perna torta\", de João Antônio
O presente trabalho analisa a construção da personagem malandra em dois contos da literatura brasileira: A volta do marido pródigo (1946) de Guimarães Rosa e Paulinho Perna Torta (1965) de João Antônio. O foco da análise incide na representação, respectivamente, culturalista e histórica do malandro pelos seus protagonistas. A construção da personagem malandra nesses contos corresponde à redução estrutural dessa figura na sociedade, seja como um tipo cultural, que, ideologicamente, representa o tipo simpático e cordial do brasileiro, ou como figura histórica, que se transformou na figura marginal e violenta do narcotraficante.
2014
Thiago Moraes Fernandes Cruz
Luuanda e Texaco : espaços de resistência e subversão
Esse trabalho tem por objetivo analisar comparativamente o espaço nas obras Luuanda, do escritor angolano de língua portuguesa Luandino Vieira, e Texaco, do escritor martinicano de língua francesa Patrick Chamoiseau. Para esse fim, partimos do pressuposto que, como se pode observar a partir de seus títulos, os protagonistas das narrativas são os espaços: os musseques luandenses e a favela martinicana, chamada bairro Texaco. Eles configuram os tempos, os narradores, os personagens e os enredos. E configuram, sobretudo, uma linguagem literária que subverte as línguas dominantes o português e o francês incorporando aos textos as línguas dominadas: o quimbundo angolano e o crioulo martinicano. Vemos, portanto, a partir dos espaços analisados nas narrativas que a história oficial é contestada e reescrita pelos autores e, em seu lugar, temos as histórias dos vencidos que nunca se calaram, que resistiram às invasões, às dominações, às assimilações e procuram sobreviver. Verificamos, pois, que o modo de sobrevivência, nas obras, é pela ocupação e subversão dos espaços e pela subversão da forma de narrar.
2016
Marcia Rosa dos Santos Silva
Rui Knopfli e Manuel Alegre: de exílios e insílios, a poesia
A tese apresenta um estudo comparativo entre a obra poética do moçambicano Rui Knopfli (1932-1997) e a do português Manuel Alegre (1936-) a partir do conceito de \"escrita de si\" (M. Foucault, 1983). Acompanha e reflete sobre o percurso literário de ambos os autores, estabelecendo relações com suas experiências de conhecimento público e suas concepções quanto à literatura, política e pátria. Em suma, os sujeitos poéticos de Knopfli e Alegre, tais quais aqueles sujeitos históricos, manifestam-se como descentrados em relação a quaisquer discursos \"oficiais\", seja o mais restrito das Academias e da Crítica Literária, seja o mais amplo do Estado Novo português - e mesmo o de grupos políticos contrários a este, incluindo, no caso do escritor africano, o da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo). São, portanto, vozes \"deslocadas\", de um eu \"insilado\". Todavia, tal sentido não se restringe ao figurativo: ambos os literatos, em sua realidade objetiva, ainda que em momentos alternados, foram marcados pela saída, traumática e por motivos políticos, de seu local original, de seu espaço, de sua pátria; conheceram de fato o exílio físico e, igualmente, transformaram tal experiência em matéria poética. Ao longo de seus percursos, sempre sob a sina de deslocados ou descentrados, a poesia de ambos revela-se igualmente ativa e repleta de caminhos e descaminhos bastante próximos - e, se a História e o mundo sensível vão ganhando ares de desilusão para aqueles homens, o discurso poético mostra-se como mais do que um meio para se denunciarem esteticamente a ditadura e a colonização portuguesas e a dor e o sofrimento dos envolvidos nas guerras coloniais/independentistas. A Poesia é também o espaço, processo e resultado para e de uma reflexão por parte do ser, constituindo essa sua discursivização como uma \"escrita de si\". Ademais, a Poesia, que por fim se torna a Pátria possível, ultrapassa os limites político-geográficos do território onde se encontram ou gostariam de se encontrar e, até mesmo e acima de tudo, os da morte, o exílio derradeiro da vida, sempre à espreita e que se (pré-)sente cada vez mais com a passagem do tempo.
Espingardas e música clássica e Em Liberdade intertextos / intertempos (uma contextualização intertextual / paródica)
Este trabalho pretende comparar e analisar a intertextualidade e a paródia que se realizam nas obras Em Liberdade e Espingardas e Música Clássica, de Silviano Santiago, brasileiro, e de Alexandre Pinheiro Torres, português. Pretende, ainda, mostrar os aspectos históricos, políticos e culturais ocorridos em Portugal e no Brasil, e que estão presentes em ambos os discursos literários.
2005
Leila Maria Rodrigues Daibs Cabral
Camilo Castelo Branco e Joaquim Manuel de Macedo: convergências na ascensão do romance nas periferias do capitalismo
O objetivo deste trabalho é analisar a ficção de Camilo Castelo Branco e Joaquim Manuel de Macedo, escritores muito populares em Portugal e no Brasil, respectivamente, entre as décadas de 1840 e 1880, período em que publicaram suas expressivas produções, que englobam romances, contos, poemas e peças de teatro, que foram, de certa forma, obliteradas pela historiografia literária ao longo do século XX. A fim de abranger uma parte significativa de suas produções ficcionais, foram selecionadas obras que, num primeiro momento, poderiam representar os principais subgêneros do romance oitocentista: os romances sentimentais Amor de Perdição e A Moreninha; as narrativas de viagem Vinte Horas de Liteira e A Carteira de Meu Tio; as narrativas fantásticas O Esqueleto e A Luneta Mágica; os romances históricos O Demônio do Ouro e As Mulheres de Mantilha; e os romances (pré-) naturalistas O Senhor Ministro e As Vítimas-Algozes. A partir da leitura destas obras, é possível depreender aspectos convergentes entre os autores, como a subversão de algumas convenções romanescas, a quebra de expectativas de leitura e o desvio das temáticas recorrentes e dos procedimentos narrativos mais usuais no século XIX. Sendo assim, o estudo parte da hipótese de que, por terem sido protagonistas da ascensão do romance em Portugal e no Brasil, periferias do capitalismo na expressão utilizada por Roberto Schwarz , países que, além disso, partilhavam a mesma língua e um fundo cultural comum, esses escritores compartilharam contextos socioculturais, de certa forma, similares. Se por um lado, a fim de atender ao mercado consumidor, precisavam manter os laços com a literatura em voga, por outro procuravam distanciar-se dela, num movimento de adesão e repulsa aos modelos romanescos.
Dimensões do herói moçambicano em As andorinhas de Paulina Chiziane
O presente trabalho tem como objetivo o estudo da representação do herói na obra literária As Andorinhas, de Paulina Chiziane, publicada em Maputo, em 2008, e no Brasil, no ano de 2013. A obra de três contos inspira-se em figuras históricas importantes à constituição da identidade moçambicana. Os heróis nacionais tratados na ficção da autora, entretanto, são narrados como personagens provenientes do universo mitológico. Com o propósito de compreender a finalidade da obra dentro do contexto social e histórico de Moçambique, este trabalho analisa o herói tanto pela sua representação simbólica, como por sua atuação no processo de desenvolvimento de uma identidade nacional em contraposição ao sistema colonial e suas mazelas. Portanto, o tema da busca da liberdade permeia a trilogia de contos e coloca o herói como o representante das transformações sociais no tempo histórico e representante das divindades no tempo mitológico.
2015
Igor Fernando Xanthopulo Carmo
Orixá e Literatura brasileira: a esteticização da deusa afro-brasileira Oxum em narrativas de Conceição Evaristo
Considerando a importância das contribuições sociais, religiosas e artísticas do capital cultural de matriz africana e afro-brasileira à cultura e à identidade nacionais, examinamos a presença de personagens associadas à Oxum em narrativas produzidas pela escritora Conceição Evaristo. Assim, o propósito desta dissertação é averiguar se e como a produção de Conceição modifica a forma de construir personagens associáveis ao orixá Oxum na produção de escritores de nosso Modernismo (Mário de Andrade e Jorge Amado), visando minimizar a reprodução de (pre)conceitos que sustêm a condição social e religiosa já subalternizada da mulher negra, das religiosidades e das divindades afro-brasileiras. Para tanto, analisaremos personagens negro-femininas constantes das obras Olhos d\'água (2016 [2014]) e Histórias de leves enganos e parecenças (2017, [2016]), de Conceição, Macunaíma (2019 [1928]), de Andrade, e Dona Flor e seus dois maridos (2008 [1966]) e Tocaia Grande (2008 [1984]), de Amado, buscando compreender quais imaginários referentes à Oxum são mobilizados em nome do projeto literário de cada escritor. Além disso, realizaremos um trabalho comparativo entre as experiências dessas personagens e os ìtàn -- textos mitológicos -- que versam sobre Oxum, a fim de que não percamos de vista que lidamos antes com interpretações e elaborações estéticas de uma fonte constituída que com uma criação arbitrária e puramente ficcional. Partindo do resultado desta pesquisa, é depreensível, a partir do acionamento do conceito de empréstimo metonímico, construído desenvolvido para esta pesquisa, que a produção literária evaristiana reivindica a recuperação de uma faceta materna, amorosa e não hipersexualizada da mulher negra brasileira, lançando mão da utilização de um símbolo potente e construtivo: a deusa afro-brasileira Oxum e suas metonímias. Dessa forma, a construção de personagens de Conceição Evaristo, na contramão do que fora realizado por Mário de Andrade e Jorge Amado, não se veicula a estereótipos difundidos nas obras canônicas, marcadas por exotismo, hipersexualização e distanciamento da maternidade de corpos negro-femininos associados à Oxum. Ao contrário, a produção evaristiana, pautada pela associação dos conceitos de escrevivência e de ubuntu, devolve aos sujeitos negros sua humanidade, subjetividade e potência geradora de vida, das quais foram despojados pela escravatura e pelo racismo científico e religioso.
Um ser tão misturado: estudo sobre o filme Sagarana, o Duelo
A dissertação objetiva aprofundar os estudos sobre o filme Sagarana, o Duelo, do cineasta mineiro Paulo Thiago, por meio de aproximações e rupturas com a matriz literária, o conto Duelo, do livro Sagarana, contribuindo para a reflexão da obra de Guimarães Rosa em outras linguagens. Preterindo a concepção de fidelidade da adaptação, a pesquisa mostra que o filme é obra autônoma, constituído com liberdade narrativa, ao incorporar personagens e ações dramáticas de outras obras de Guimarães, na tentativa de abarcar temáticas recorrentes do escritor mineiro, tais como a jagunçagem, a violência, a força do acaso, as questões metafísicas, o arcaico e o moderno, etc. As análises e interpretações da dissertação apontam que as propostas estéticas, temáticas e formais de Sagarana, o Duelo são resultados do diálogo do jogo de intenções pessoais do diretor e do contexto histórico, cultural e social da época de sua realização, o começo da década de 1970. A pesquisa se fundamenta na ideia de que o filme é constituído de misturas, em que o cômico e o trágico, o místico e o mundo terreno e o imbricamento de gêneros se fundem na narrativa. Pretende-se mostrar como Sagarana, o Duelo incorpora aspectos do faroeste, do gesto cômico e da temática regionalista, por meio de configurações estruturais da narrativa, tais como a tessitura dramática, a dimensão espacial, a caracterização e interpretação de personagens, aspectos da fotografia e a trilha sonora.
Estórias da subjetividade pós-moderna: configurações identitárias na prosa de ficção de João Melo
Frente à importância do papel conferido a literatura no processo de formação nacional desse país, o presente trabalho investiga que tipo de sujeito é representado pelas personagens da ficção em prosa publicada pelo do escritor angolano João Melo entre os anos de 1999 e 2009. Através da análise dos contos que compõe todo o corpo de prosa de ficção produzido por Melo, conclui-se, que as configurações identitárias presentes ao longo de suas obras constituem aquilo que o teórico britânico Stuart Hall chama de sujeito pós-moderno, cuja subjetividade é moldada pela dominante histórica e cultural da pósmodernidade, fruto do desenvolvimento do capitalismo tardio em Angola.
2010
Emanuelle Rodrigues dos Santos
Do sonho à desconstrução: a nação em Mayombe e Predadores, de Pepetela
A formação deste trabalho tem como horizonte a comparação entre as obras Mayombe e Predadores do autor angolano Pepetela, principalmente no tocante a perspectiva nacional que está impressa em cada texto, todavia de maneiras diversas. A possibilidade de ler as obras de maneira muito próxima aos fenômenos históricos angolanos é aquilo que faz com que se projete sob os olhos a questão nacional que é tão cara à série literária angolana, principalmente caso se tenha em mente a formação do jovem país e a necessidade de construir a identidade. As obras em questão registram, em momentos diversos, esta construção e as nuances ideológicas no processo nacional, cada qual em uma época e quando olhadas uma em relação a outra, consegue-se depreender mais, primordialmente aquilo que está no âmbito ideológico da desconstrução e da perda de paradigmas, sejam eles políticos ou culturais. É o efeito da pós-modernidade que obriga a sociedade em questão a descobrir-se sem chão e sem certeza de nada, uma vez que não mais se pode falar de estado colonial, mas sim pós-colonial e, como tal, terra aberta a possibilidades, sejam elas propositivas ou niilistas com relação à formação nacional. Dessa maneira, para depreender mais que obviedades da relação dessas obras, deve-se ter em mente que as formações híbridas desse espaço obrigam o desapego teórico, caminhando na direção da colaboração entre as disciplinas de modo a captar significativamente algo deste contato. Assim, interrogar-se sobre as obras Mayombe e Predadores tanto no que toca nos pontos de contato quanto nos de repulsão é mais que exercício teórico, é questionar-se quanto à legitimidade do processo nacional que está subentendido nas duas obras. Pepetela, como uma espécie de demiurgo, registra aquilo que está fora do lugar, destoando a análise, e que aos poucos, apresenta como um acre sabor na boca de quem lê, aquilo em que se transformou o sonho de libertação angolana, justamente o antípoda do processo que se apossa e faz com que o capitalismo mais selvagem possível arrebate o sonho comunista de princípio, e que não mais é possível crer num Estado aos moldes do Ocidente do século XIX, mas simplesmente os frangalhos do mesmo. Entretanto, não se pode ler o contexto acima verificado de modo apenas negativo, uma vez que dele pode se verificar obras literárias complexas que não só dão conta da fotografia histórica, mas também de todo um trabalho de linguagem e de sentido que, para ser de fato apreciado, demanda o trabalho técnico hermenêutico de avanço e retrocesso, do micro ao macro, para que se produza algum conhecimento satisfatório a respeito das obras.
2012
Jose Antonio Pires de Oliveira Filho
Como você está diferente, vovó! Aspectos sócio-históricos dos contos populares
É de conhecimento geral o fato de que os contos de fada transmitem importantes mensagens carregadas de ideologia que, às vezes, diferem de maneira significativa. Isso ocorre em razão da época ou localidade em que a produção é contextualizada, como podemos bem ver nas variações do conto Chapeuzinho Vermelho, seja aqueles da tradição oral medieval, os adaptados por Perrault ou pelos Irmãos Grimm, ou mesmo as versões da contemporaneidade. Traçando um percurso histórico das transformações dos contos de fada de origem popular partindo da França, percorrendo Alemanha, Portugal e culminando no Brasil o presente estudo busca verificar as transformações ocorridas nessas sociedades, mostrando como elas foram representadas nos contos e quais mensagens transmitem. Para o presente estudo, serão utilizados o Comparatismo Literário e elementos de Teoria Literária por meio de um olhar sociológico e histórico. Após a definição do quadro teórico-metodológico e da base conceitual, partiremos para uma breve análise de algumas sociedades e como sua prática social pode, de certo modo, ser representada nos contos de fada.
2012
Nárgyla Maria Lourenção Pimenta Pinheiro
A arte dos \"quadrinhos\" e o literário: a contribuição do diálogo entre o verbal e o visual para a reprodução e inovação dos modelos clássicos da cultura
A interação entre diferentes linguagens e meios artísticos é uma das marcas presente no processo de comunicação humana, sobretudo hoje em dia. Um dos aspectos que se destaca nessa interação é a constante revisitação de obras que são re-elaboradas em diferentes suportes comunicativos. É o que ocorre quando temos o diálogo entre os quadrinhos e a literatura, artes que trabalham com a narratividade e que trazem em si peculiaridades que as definem como importantes meios de veiculação e propagação de idéias, valores e ideologias. Nesse estudo procuramos abordar a relação entre os dois meios artísticos destacando se tal diálogo propicia uma reprodução ou questionamento das tradições culturais, atualizando-as (ou não) a partir de sua transposição de uma arte para outra. A partir de teorias que versam sobre quadrinhos, intertextualidade, dialogismo, história da arte e da literatura e outras, traçamos um painel das diversas relações que se estabelecem entre obras criadas nos quadrinhos a partir do material literário, e que se revelam por meio de uma gradação em que temos desde obras que remetem diretamente ao texto clássico literário até aquelas que procuram fazer dos elementos oriundos da literatura um mote para o desenvolvimento de novas produções em quadrinhos. Também num movimento contrário, procuramos mostrar como os quadrinhos fornecem material para a criação de obras na literatura e como sua linguagem múltipla pode atuar em conjunto com o texto literário para a construção de obras mistas.
2008
Maria Cristina Xavier de Oliveira