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Estórias que ilustram a História: as narrativas ficcionais de Lília Momplé
A presente dissertação tem por objetivo estudar a obra Ninguém matou Suhura da escritora Lília Momplé, analisando as questões em torno da opressão estabelecida pelo regime colonialista português em Moçambique. Para tanto, três eixos centrais nortearam a análise crítica desenvolvida, a saber, um primeiro eixo que se organiza em torno da força de trabalho; um segundo eixo voltado para uma falsa organização de um projeto educacional para o país; e, um terceiro, que diz respeito às relações dialéticas estabelecidas entre as personagens em seus diferentes segmentos sociais.
2016
Silvaneide da Silva Costa
\'Memórias Póstumas de Brás Cubas\' e \'Coração, Cabeça e Estômago\' - Machado de Assis e Camilo Castelo Branco: leitores e críticos do romantismo
O presente trabalho tem como objetivo principal analisar as posturas de Camilo Castelo Branco e Machado de Assis como leitores e como críticos do Romantismo que, de certa forma, colocaram em xeque a aplicação rígida das teorias e doutrinas vigentes para a crítica oitocentista como o naturalismo, o positivismo, o racionalismo e os ideais românticos. Realizamos este trabalho partindo do estudo das obras Coracão, Cabeça e Estômago, de Camilo Castelo Branco, e Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Buscamos demonstrar aproximações e similaridades presentes nas duas obras, destacando textos críticos que apontaram tais semelhanças para apresentarmos algumas idéias que desenvolvemos ao longo da pesquisa. Como substrato teórico para o trabalho, utilizamos os livros Introdução ao estudo da novela camiliana, de Jacinto do Prado Coelho e Um mestre na periferia do capitalismo, de Roberto Schwarz.
2007
Geraldo da Aparecida Ferreira
Literatura e filosofia: alteridade e dialogismo poético nas obras Lavoura Arcaica e Um Copo de Cólera, de Raduan Nassar
O estudo das obras de Raduan Nassar constitui-se de um trabalho a respeito da linguagem poética pautada no exercício dialógico entre as personagens. Segundo o pensamento de Emmanuel Lévinas uma relação pautada na ética exige um olhar para o rosto do outro e dessa relação tem-se a responsabilidade, uma apreensão da subjetividade exteriorizada e não mais contida no ser. Nesse caminho analisam-se os personagens protagonistas das obras Lavoura Arcaica (1975) e Um copo de cólera (1978) que estão durante toda narrativa em relação de descoberta e devir. Vistos como personagens conceituais ou filosóficos, na concepção de Deleuze e Guattari, André, adolescente em busca de hospitalidade e alteridade na relação com o outro, traz em sua composição traços de impessoalidade, refletindo sua condição não recaindo sobre si, mas estendendo para um fora, o neutro de Blanchot que considera essa possibilidade de abertura como espaço para o um outro acontecimento. O chacareiro, da segunda obra, também em exercício dialógico, porém não poético compõe de atos de enunciação que tratam de seu percurso histórico-social e pessoal. Diante de sua interlocutora trava um embate que permeia as leis da hospitalidade frente ao acolhimento e inabitação da morada, do lugar de pertença.
2011
Ana Carolina Belchior de Jesus
Na raiz, a fome: uma leitura dos romances Vidas secas, de Graciliano Ramos, Os flagelados do vento leste, de Manuel Lopes e Famintos, de Luís Romano
Partindo dos romances Vidas secas, de Graciliano Ramos (1938), Os flagelados do vento leste, de Manuel Lopes (1959) e Famintos, de Luís Romano (1962), buscamos investigar as estratégias discursivas dos autores de nosso corpus que se debruçaram sobre a fatia social menos favorecida daquele momento histórico. Nos dedicamos, em especial, às denúncias dos autores que trouxeram à luz temas que atravessavam as três prosas de ficção: a fome, o banditismo e a opressão. Encontramos em Josué de Castro uma rica pesquisa que permitiu que analisássemos a fome não apenas como flagelo, mas também como fato social passível de desdobramentos mais complexos. O historiador Eric Hobsbawm e o filósofo Louis Althusser fundamentaram nossa investigação de tais desdobramentos. Destacamos que nossa perspectiva tem como horizonte o comparatismo de solidariedade proposto pelo crítico Benjamin Abdala Junior.
2017
Maria Luzia Carvalho de Barros Paraense
Diálogos possíveis entre Maria Gabriela Llansol e Clarice Lispector: modos de (re)pe(n)sar o ser-criança
O objetivo deste trabalho é estudar uma criança nova e potencializada, que cresce na escrita, tanto na obra da escritora Maria Gabriela Llansol quanto na de Clarice Lispector. Tratamos essa criança como uma metáfora de um ser-vivo, que se arrisca em novas compreensões sobre a escrita, transformando seu olhar diante da leitura. Investiga-se a escrita como um lugar fecundo, onde haja o desenvolvimento do ato criativo pelos seres, denominado entre-lugar. Nele, ocorre a continuidade do ser, que aprende sobre si a partir do outro, num movimento de persistência. Utilizam-se alguns títulos, como Um beijo dado mais tarde e Amar um cão, de Llansol, e Quase de verdade, Mistério do coelho pensante, A mulher que matou os peixes e A vida íntima de Laura, de Lispector, para mostrar a relação entre o ser e a leitura através da sua mudança de olhar. Discutem-se várias noções, como as de criança, aprendizagem, leitura, textualidade, liberdade, representação, autor, pensamento, percepção e tempo. Fundamenta-se a teoria através das obras de Clarice e de Maria Gabriela, acima citadas, além da crítica especializada, como Maria dos Prazeres Santos Mendes, Nádia Gotlib, Olga de Sá, Maria de Lourdes Soares, Jorge Fernandes da Silveira, João Barrento, Eduardo Prado Coelho, Eduardo Lourenço, Lúcia Castelo Branco, João Barrento e Maria Etelvina Santos.
2014
Danielle de Paiva Pereira Lopes
Febre e poesia: o impulso febril em Mário de Andrade e Álvaro de Campos
Este trabalho constitui-se como um estudo comparativo entre as poéticas de Álvaro de Campos e Mário de Andrade, a partir dos poemas Ode Triunfal e Ode ao burguês, no sentido de oferecer uma outra possibilidade de leitura para um material poético já acirradamente analisado pelo crivo crítico. Considerou-se o signo febril como instrumento de verificação de vozes exaltadas de tais poesias, de maneira a revelar os procedimentos no campo estético e expressivo significativos para um momento de acentuado extravasamento literário: o Modernismo. O percurso estabelecido passa pela força das vanguardas; pela potência matriz do movimento literário essencialmente dionisíaca relacionada às considerações de Nietzsche e Eurípedes; além de abordar as relações entre Portugal e Brasil neste período, para corroborar com a perspectiva comparativa entre os poetas mencionados destes países.
2011
Suillan Miguez Gonzalez
Repertórios da literatura brasileira nos livros didáticos: uma perspectiva antirracista
Esta pesquisa busca investigar os repertórios da literatura brasileira disponibilizados nas coleções didáticas de língua portuguesa para o Ensino Médio aprovadas pelo PNLD 2015, de modo a verificar quantitativa e qualitativamente a inserção de textos que tocassem a temática racial, independentemente do pertencimento étnico-racial de seus autores, por um lado, e especificamente a utilização de textos de autoria negra, por outro. Assim, a partir de um aparato teórico interdisciplinar que engloba as áreas dos estudos literários, da história, da sociologia, da educação e da psicologia social , analisa-se como tais textos e autores foram aproveitados pelas coleções, considerando o contexto em que aparecem nos livros, com ênfase nas atividades de interpretação literária. Constata-se lacunas importantes nos dados encontrados, uma vez que a inserção por si só dessas obras e desses escritores não é suficiente para uma reformulação do livro didático como instrumento possível de uma educação antirracista. Desse modo, são propostas alternativas tanto de repertório, privilegiando os nomes contemporâneos da literatura negro-brasileira, quanto de abordagem de autores que já figuram no cânone, alternativas pensadas para relacionar-se de maneira orgânica com todo o conteúdo das coleções didáticas, e não mais como apêndices e notas de rodapé.
2019
Nara Lasevicius Carreira
A lavoura, a guerra, a caça: os elementos mitológicos em três romances
A presente tese pretende, a partir da análise dos romances Lavoura arcaica (1975), de Raduan Nassar, Terra sonâmbula (1992), de Mia Couto, e Crônica de uma morte anunciada (1981), de Gabriel García Márquez, estabelecer um diálogo entre romance e mitologia. Sob tal perspectiva, a tese procura examinar como se dá a interação do tempo mitológico com o tempo histórico e o papel da reinterpretação dos mitos e sua repercussão nas obras literárias escolhidas. Para desenvolver tal proposta, apresentaremos lineamentos teóricos básicos que nos permitirão definir os elementos caracterizadores da presença do mitológico nos textos ficcionais selecionados para análise. Apontaremos, em primeiro lugar, a alusão a um determinado mito reconhecível; em seguida, a presença de elementos rituais que aí estabeleçam a conexão do mito com o sagrado; e, por último, o papel da palavra como elemento fundamental que reatualiza, preserva e difunde a memória do sagrado, isto é, do mitológico. Os romances escolhidos constituem verdadeiros exemplos dos processos de experimentação desenvolvidos em cada um desses campos o mito, o rito, a palavra numa prática artística que congrega diferentes maneiras de ver o mundo, assim como de reinterpretá-lo criativamente por meio de seus respectivos imaginários. O objetivo central de nosso trabalho é, pois, mostrar que a presença de elementos mitológicos nos três romances constitui o componente estrutural básico das três narrativas e que essa presença se manifesta de modo específico em cada uma das obras analisadas.
2019
Claudia Esperanza Durán Triana
A geração da utopia e Memórias do cárcere: a resistência como re-existência
Em A geração da utopia, do escritor angolano Pepetela, e em Memórias do cárcere, do escritor brasileiro Graciliano Ramos, ambos os autores denunciam formas de opressão e alienação usadas pelos governos: o colonialismo português em Angola, e o ditatorial, de Getúlio Vargas, no Brasil. Embora o texto de Pepetela trate de um romance, e o de Graciliano Ramos, de um livro de memórias, esses textos se aproximam pela ideia de um balanço histórico crítico. Posicionados ao lado dos oprimidos, invertem o discurso oficial e expressam a voz dos vencidos. Juntam as partes do que fora fragmentado e refazem a unidade - da nação, em A geração da utopia, e dos homens, em Memórias do cárcere. Como intelectuais engajados, elaboram uma literatura de resistência - capaz de levar à re-existência e à desalienação - e que aponta, utopicamente, para a possibilidade de alcançar um futuro melhor, por meio de um agir contínuo no presente, pleno de esperanças.
2011
Maria Alzira de Souza Santos
Pinheiro Chagas, um escritor olvidado
Este estudo tem por objetivo refletir sobre uma figura literária pouco estudada, Manuel Pinheiro Chagas (1842-1895), escritor português considerado pela crítica principalmente como romancista histórico. Ao eleger o romance histórico como narrativa romântica, parece que Chagas tenta disputar espaço com o romance realista/naturalista, mesmo depois da consolidação do Realismo. Por meio da análise de quatro de seus romances, A virgem Guaraciaba (1865), A máscara Vermelha (1873) e a sua continuação O juramento da Duquesa (1873), e A descoberta da Índia. Contada por um marinheiro (1890), verificamos como o projeto literário deste escritor, que se inicia com a efabulação da História, vai convergindo para um realismo pouco romantizado, que ele denominou de estudo histórico romântico.
Entre melindres e espertezas: personagens malandras, nos contos de Lima Barreto e José da Silva Coelho
A literatura é campo fértil para refletirmos sobre os mais variados aspectos da sociedade e a obra de Antonio Candido certamente é uma referência dessa perspectiva de leitura. Nesse sentido, analisamos comparativamente contos do escritor brasileiro Lima Barreto e do goês José da Silva Coelho, com foco nos comportamentos de seus protagonistas. Partindo da observação de semelhanças e diferenças nas formas de contornar as dificuldades, ou de conquistar uma melhor posição social, em espaços organizados a partir do colonialismo português, procuramos demonstrar que as atitudes imorais das personagens não eram apenas um recurso narrativo cômico, mas eram fruto de uma reflexão crítica dos autores sobre essas duas sociedades marcadas pela colonização ibérica. Tais comportamentos são representados por figuras repletas de espertezas, astúcias e malandragens, que nem sempre logram êxito nos seus golpes. Desse modo, discutimos a representação literária do caráter nacional brasileiro por personagens de Lima Barreto e a representação de traços semelhantes por personagens de Silva Coelho. Essas análises culminam na discussão sobre a possibilidade de que as semelhanças apontadas possam ser fruto da longa dominação portuguesa, tendo-se consolidado com a implementação das Repúblicas brasileira e portuguesa.
2016
João Figueiredo Alves da Cunha
Narrativa da espera no romance angolano contemporâneo: notas às alegóricas Noites de vigília de Boaventura Cardoso
Esta Dissertação, intitulada Narrativa da Espera no Romance Angolano Contemporâneo: Notas às alegóricas Noites de Vigília de Boaventura Cardoso, propõe a leitura de Noites de vigília (2012), do angolano Boaventura Cardoso. Essa obra, voltada para a revisitação do passado histórico-político angolano, sob o signo da alegoria lançada no universo teorizador por Walter Benjamin, irrompe com a história oficial ao pôr em questionamento o projeto da Terra Prometida, cujo marcador é a espera ancorada no desejo de fundação de uma associação das personagens- protagonistas, a saber: Quinito, do MPLA, e Saiundo, da UNITA. Por conseguinte, através do comparativismo literário, procuramos analisar como a recriação do sociopolítico angolano, em Noites de Vigília, indicia a desrepressão da história, visando a consumação do projeto de comunidade imaginada angolana, hasteando-se, desse modo, a bandeira da igualdade social, dando-se voz e vez aos da pereiferia social. Assim, procura-se demonstrar como a ficcionalização do histórico-político angolano denuncia um socius na contramão do apregoado ao longo do movimento anti-colonial, haja vista a proclamação da sociedade pautada na igualdade, liberdades e bemestar coletivo ainda em processo.
Retratos do colono, do colonizador, do cidadão: a representação literária da minoria branca em Nós, os do Makulusu e em outras narrativas angolanas
Inspirados nos retratos de colonizadores e colonizados apresentados por Albert Memmi e Franz Fanon, escolhemos algumas narrativas angolanas para perceber de que modo são retratados literariamente os membros de uma minoria: os brancos, colonizadores ou colonos e, num momento posterior, cidadãos da república independente. É, portanto, um estudo de personagens literários, sua construção, constituição, e inclui as sugestões interpretativas que, a partir deles, pudemos fazer. Nós, os do Makulusu (1975), de José Luandino Vieira (1935-) é nosso corpus principal. Percorremo-lo do núcleo central de personagens aos mais fugidios e efêmeros. Constituem um corpus secundário os romances As lágrimas e o vento (1975), de Manuel dos Santos Lima (1935-), em que estudamos os personagens brancos e a visão que os colonizados têm deles; de Pepetela (1941-), A geração da utopia (1992), foco na personagem Sara Pereira, seus anos de exílio e seu retorno à terra natal; de Manuel Rui (1941-), Rioseco (1997), o personagem sô Pinto, português que continuou em Angola após a debandada dos brancos em 1975 e vive no Mussulo. Todas estas obras dialogam com momentos historicamente determinados, numa linha do tempo que vai de meados da década de 1930 até meados da década de 1980, da sociedade colonial à crise colonial e ao país independente. Procuramos pensar estas obras em diálogo não apenas com as outras literaturas de língua portuguesa, com as quais têm relação óbvia, também com outras obras da literatura ocidental, da qual elas, devemos enfatizar sempre isso, também fazem parte.
João Melo, pós-modernidade, pós-modernismos: condições contemporâneas globais na produção de O dia em que o Pato Donald comeu pela primeira vez a Margarida
Este trabalho procura estudar as noções de pós-modernidade e pós-modernismo no livro de contos O dia em que o Pato Donald comeu pela primeira vez a Margarida (2006), do escritor angolano João Melo, sob o viés do materialismo histórico. Parte das relações entre fetiche da mercadoria e literatura para estabelecer uma ferramenta de análise que permita ver que o estético não é um campo isolado do conhecimento. Entende que para definir se há ou não uma época pós-moderna é necessário estudar as condições materiais de produção contemporâneas, fá-lo seguindo o que Harvey chamou de acumulação flexível, e vê o pós-modernismo como tratamento estético dessa matéria histórica. Analisa a organização do livro relacionando-a à atual lógica da mercadoria, e compara-a com a organização por tema do livro Filhos da Pátria (2001). Estuda o arranjo das vozes dos contos Tio, mi dá só cem e O feto e a estrutura de Ngola Kiluanje; a lógica do fetiche em O dia em que o Pato Donald comeu pela primeira vez a Margarida, o arranjo das vozes em O Canivete agora é branco e o campo de refugiados como espaço paralelo de construção de Angola em \"Angola é toda terra onde planto minha lavra\".
2013
Emiliano Augusto Moreira de Lima
Luuanda delenda est: a destruição literária da cidade de Luanda em Os transparentes, de Ondjaki
Nas escusas veredas da Luanda contemporânea edificada no romance Os transparentes (2013), de Ondjaki, todos os caminhos, desde o começo, parecem apontar para uma única solução possível: a destruição. Analisaremos por que a cidade do romance deve ser destruída, a começar pela construção histórica desse arquétipo, de acordo com Northrop Frye. A ocorrência estética desse temário poderá ser constatada na forma romanesca, consoante as formulações de Bakhtin, evidenciando o caráter vivo e moderno do romance em questão, bem como a categoria de cronotopo ocupada pela cidade. Esse caminho será percorrido, com um recuo para investigar o lugar deste livro no pós-Independência, até chegar às causas da destruição presentes nos subterrâneos da sociedade, que enfraquecem os alicerces de Luanda na narrativa, e fazem-na ser consumida pelo fogo quase impiedoso ateado pelas mãos daqueles que estão às voltas com o poder político-econômico e que fazem da cidade viva da narrativa um lugar de embates, uma zona de contato, como será discutido nas considerações finais.
Corpo de romances de autoras negras brasileiras (1859-2006): posse da história e colonialidade nacional confrontada
O romance é um gênero pouco presente nos estudos críticos e bibliográficos dedicados a autoria negra no Brasil. Intervindo nesse cenário, o principal objetivo deste trabalho é tornar visível o conjunto de romances cujas autoras brasileiras são negras, reunindo suas obras dispersas num arco histórico que atinge três séculos. A leitura comparada evidenciou vários pontos de contato, dos quais emerge um pensamento partilhado pelas diversas narrativas. Os romances se aproximam entre si ao recorrerem continuamente a um mesmo solo histórico, que resulta na posse da História. Para tanto, desenham uma imagem crítica da nação ao apontarem a sua matriz colonial constitutiva. Maria Firmina dos Reis (Úrsula, 1859), Ruth Guimarães (Água Funda, 1946), Carolina Maria de Jesus (Pedaços da fome, 1963), Anajá Caetano (Negra Efigênia: paixão do senhor branco, 1966), Aline França (A mulher de Aleduma, 1981), Marilene Felinto (As mulheres de Tijucopapo, 1982), Conceição Evaristo (Ponciá Vicêncio, 2003) e Ana Maria Gonçalves (Um defeito de cor, 2006) reelaboram a modernidade brasileira, demarcando os lugares de poder e subalternidade, constituídos pela intersecção de gênero e raça. As obras reunidas nesta tese articulam uma inteligibilidade pluriversal, porque não apagam a presença da alteridade; transtemporal, porque o passado que formulam também produz significados para o nosso presente; e posicionada, porque articulam em seu bojo o rompimento do silenciamento sobre a voz da mulher negra.
2019
Fernanda Rodrigues de Miranda
O cânone desgastado: hegemonia, masculinidades e crise
O mundo sofreu uma mudança drástica após a Segunda Guerra Mundial. O panorama político, com as novas configurações de poder com a ascensão dos Estados Unidos e da União Soviética, mudou também a vida em sociedade. Fatos importantes como a perseguição a qualquer um que se desconfiasse ser comunista, e o American Way of Life estiveram presentes durante muitos anos após o final do conflito. As artes como o Cinema e a Literatura têm um papel fundamental nessa nova configuração social, levando ao mundo a imagem da família nuclear como a perfeita e desejável. O teatro teve um renascimento durante esses anos do final da década de 1940, e durante todos os anos 1950. Tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, dramaturgos surgiam como contestadores responsáveis por textos que foram considerados marcos para a História do Teatro. Tennessee Williams e Nelson Rodrigues criaram tramas e personagens que refletiam o meio em que se inseriam, muitas vezes com um viés moralista, outras como importantes ferramentas de contestação social. Os personagens Stanley Kowalski, de A Streetcar Named Desire, e Raul, de Perdoa-me por me traíres, ambos os principais antagonistas de suas peças, são analisados com foco nas características de masculinidade que apresentam. Para tanto, foi necessário estudar os demais personagens para entender de forma mais ampla como eles se inserem em suas histórias. O modelo de masculinidade hegemônica conceituado por Connell é buscado nesses homens, com o objetivo de tentar provar sua presença nas tramas.
2019
Vanessa Rodrigues Thiago
África, axis mundi: uma leitura d\'O quase fim do mundo de Pepetela
O escritor angolano Pepetela possui em sua produção literária a obra O quase fim do mundo (2008), na qual cria condições para o reinício da humanidade a partir de poucos sobreviventes a uma hecatombe, o que a faz ser inserida no rol de discursos escatológicos. Seu diferencial, a nosso ver, estará nas discussões suscitadas quanto à realidade africana, em especial de Angola. Nesse sentido, há no romance a formação de uma sociedade a partir de valores principalmente africanos, já que África surge como o espaço central da nova era - são desse continente, em sua quase totalidade, os indivíduos selecionados e ali reconstroem suas vidas e o passado que ficará como História. Paralelamente, é possível relacionar a narrativa e seus elementos à formulação de uma nova utopia, desta vez priorizando características próprias em detrimento daquelas importadas (a não ser que relidas sob a ótica local). No entanto, o autor sabe da complexidade da empresa e não se furta a apontar e problematizar entraves. Com o livro OQFM, Pepetela volta a pôr em pauta os rumos e os projetos de seu país, situando-o na produção estético-política da literatura angolana de língua portuguesa.
Literatura e representação social das mulheres em Cabo Verde: vencendo barreiras
Esta dissertação analisa comparativamente textos cabo-verdianos de autoria masculina e feminina à luz do tema Literatura e representação social das mulheres em Cabo Verde, com o objetivo de demonstrar como constroem a historicidade das mulheres naquele contexto, com base na abordagem de gênero e numa hermenêutica do cotidiano feminino. Diante do exposto, centramos as leituras nas personagens femininas das narrativas, especialmente as protagonistas, no intuito de acompanhar suas trajetórias de objetos a sujeitos históricos, tendo em conta a complexidade do fenômeno da emancipação feminina em Cabo Verde e a entrada um pouco tardia, todavia decisiva, de produções de mulheres no cânone literário. Buscamos demonstrar, em nossa pesquisa, como a escritura literária masculina de António Aurélio Gonçalves, Baltasar Lopes, Manuel Ferreira, Oswaldo Osório, Teobaldo Virgínio e Virgílio Pires apreende e apresenta realidades femininas, sobretudo por meio da exposição, ao passo que as escrituras literárias femininas de Camila Mont-Rond, Dina Salústio, Fátima Bettencourt, Ivone Aída e Maria Margarida Mascarenhas revelam subjetividades femininas que lançam novos olhares e novos recortes que dialogam o universo representado pela ótica masculina.
2010
Sonia Maria Alves de Queiroz
Machado de Assis em jornal e livro: os diferentes suportes e sentidos dos três contos de Papéis Avulsos publicados antes de Memórias Póstumas de Brás Cubas
Em chave comparatista, esta dissertação pretende analisar os efeitos de sentido produzidos pelos contos \"A Chinela Turca\", \"Uma Visita de Alcebíades\" e \"Na Arca\", de Machado de Assis, nos diferentes suportes editoriais em que foram inicialmente publicados. Ademais de terem sido reunidos na coletânea Papéis Avulsos, organizada em 1882 pelo próprio autor, cada um dos contos em questão foi publicado em um jornal da época: \"A Chinela Turca\" na folha A Epocha, em novembro de 1875; \"Uma Visita de Alcebíades\" no JJornal das Famílias, em outubro de 1876; e \"Na Arca\" n\'O Cruzeiro, em maio de 1878. Sendo assim, além da análise intrínseca dos textos, a presente investigação conferirá destaque aos conceitos de ambiência discursiva e de mediação editorial, tendo em vista o pressuposto mais amplo de examinar o modo por meio do qual os diferentes espaços de publicação de um escrito participam da significação por ele produzida. Por fim, esses três contos são os únicos presentes no livro que foram publicados antes de Memórias Póstumas de Brás Cubas, isto é, ainda durante o período conhecido como a \"primeira fase\" da obra do escritor. Em perspectiva mais ampla, portanto, propõe-se estabelecer conexões, ainda que sumariamente, entre elementos provenientes dos estudos machadianos, da teoria literária e da história da imprensa e do livro no Brasil a partir dos referidos contos e de suas trajetórias de veiculação.
2020
Luiza Helena Damiani Aguilar