Repositório RCAAP
O querer, o sentir e o pensar de Rudolf Steiner na literatura para crianças e jovens: os atos da vontade
Rudolf Steiner (1861-1925) foi um filósofo, jornalista e educador. Atualmente seu nome está associado ao movimento Camphill de educação curativa, sua arquitetura, vários estudos sobre religião, à agricultura biodinâmica, à medicina antroposófica e à pedagogia Waldorf. O objetivo principal desta pesquisa é investigar a contribuição e validade das concepções sobre o querer, o sentir e o pensar de Rudolf Steiner para os estudos literários. Espera-se contribuir para a ressignificação do papel da literatura como força impulsora na mediação entre o sentimento e a razão para o desenvolvimento e constituição do pensar conceitual e formação do ser harmônico e integral. Esta tese contém uma introdução e seis capítulos. O capítulo 1 dá uma ideia geral do contexto de Rudolf Steiner e trata de sua formação, carreira, interesses profissionais, bem como sobre algumas possíveis influências sobre seu pensamento. O capítulo 2 apresenta as concepções do homem, do querer, do sentir e do pensar que aparecem na obra Filosofia da Liberdade e suas relações com outros estudos do autor. Discute também a importância da arte e das narrativas para a formação do ser humano integral, harmônico e espiritualmente livre. O capítulo 3 compara as ideias de Steiner acerca do pensar, da criança, das narrativas com as concepções de Edgar Morin e Walter Benjamin. Também apresenta indicações de narrativas propostas por seguidores de Steiner. O capítulo 4 apresenta a metodologia e as obras utilizadas na experiência estética de recepção de leitura desenvolvida com ex-alunos formados pela pedagogia Waldorf e ex-alunos formados por outras pedagogias. O capítulo 5 discute os resultados da pesquisa. O capítulo 6 apresenta algumas considerações finais sobre o assunto.
2014
Sandra Regina Kuka Mutarelli
Vozes subterrâneas: embates discursivos em Angústia, de Graciliano Ramos, e Voz de prisão, de Manuel Ferreira
Este trabalho visa explorar as relações entre duas obras produzidas em língua portuguesa e de algum modo vinculadas à tendência engajada da literatura modernista: Angústia, de Graciliano Ramos, e Voz de prisão, de Manuel Ferreira. Entre os nexos comparativos estão a hipótese de que, nos dois livros, são expostas e exploradas as tensões existentes entre discursos hegemônicos e discurso subterrâneos. Esse embate discursivo cultural, estético, ideológico será pensado como fatura romanesca e também a partir da participação e/ou intermediação da figura do intelectual, a qual, de modos diferentes, tem relevância nas obras em questão.
2015
Adriano Guilherme de Almeida
Identidade social e literatura: As duas sombras do rio e As visitas do Dr. Valdez
Esta dissertação propõe uma interpretação das obras As Duas Sombras do Rio, de 2003 e As Visitas do Dr. Valdez, de 2004 de João Paulo Borges Coelho, a fim de analisar como esses romances trazem à tona a questão da formação da identidade moçambicana. Para tanto, enfrenta-se os romances a partir dos seguintes aspectos: as relações de influência suscitadas pelo período de 1974-1985, abarcado pelos dois romances; o espaço e o tempo como estruturas decisivas na configuração das relações sociais representadas pelas narrativas. Nesse sentido, interessa observar como esses aspectos articulam-se à formação identitária no bojo de um processo de transição da situação colonial para a independência, seguida da eclosão da guerra civil e como eles exercem função estruturante das narrativas. Discute-se, ainda, em que medida o autor moçambicano articula o espaço e o tempo com o intuito de transgredir a narrativa oficial difundida em torno da ideia de nação.
2017
Laurinda Aparecida Maiorquim Gomes da Silva
Visões do (des)encanto: um estudo sobre o feminino transgressor em Clarice Lispector e Maria Judite de Carvalho
A pesquisa de Doutorado intitulada Visões do (des)encanto: um estudo sobre o feminino transgressor em Clarice Lispector e Maria Judite de Carvalho tem por objetivo estudar as personagens femininas das escritoras nas obras Laços de família (1960) e Flores ao telefone (1968), tendo como ponto de partida a relação existente entre a criação das personagens e o papel social vivido pela mulher em tal época. O projeto literário das duas autoras caminha atento às mudanças sociais e a transformações ocorridas no universo feminino, surgindo então a necessidade de dar voz às mulheres através de suas figuras ficcionais. A oposição entre destino/liberdade é questionada no cotidiano de personagens femininas de classe média acostumadas a viver à sombra do masculino, sem criar um lugar para si no mundo. As autoras lançam um olhar profundo sobre a sociedade, este se reflete nas angústias e malogros de suas personagens que precisam tantas vezes romper com a conduta social para serem livres. Tal processo de transgressão das personagens no universo das duas autoras é estudado tendo como base teórica o estudo sobre os vários aspectos do feminino em O segundo sexo, de Simone de Beauvoir.
2011
Jane Pinheiro de Freitas
De armas na mão: personagens-guerrilheiros em romances de Antonio Callado, Pepetela e Luandino Vieira
Estudo sobre a representação literária da figura do guerrilheiro em romances do brasileiro Antonio Callado (1917-1997) e dos angolanos Pepetela (1941-) e José Luandino Vieira (1935-). Considerando que os autores recriam ficcionalmente realidades muito diferenciadas, em países e continentes distintos, num momento histórico que só as aproxima pelo contexto da Guerra Fria, mas compartilham personagens envolvidos na contestação armada do poder, queremos examinar como essas figuras são construídas, como se aproximam ou se distanciam, e de que maneira se transformam à medida que os textos produzidos se afastam do momento histórico que lhes serve de tema. Um capítulo inicial descreve o panorama geral das lutas políticas no século XX, o fim dos grandes impérios coloniais, o contexto da Guerra Fria, e traça um paralelo minucioso entre a resistência armada à ditadura brasileira e a luta guerrilheira contra o colonialismo português, situando os autores nesse contexto. Depois há uma discussão sobre a figura do guerrilheiro como motivo literário, exemplificado em Che Guevara, um levantamento de questões teóricas sobre o personagem literário e a apresentação e discussão do corpus: Quarup (1967), Bar Don Juan (1971), Reflexos do baile (1977), Sempreviva (1981), de Callado; As aventuras de Ngunga (1973), Mayombe (1980), A geração da utopia (1992), O planalto e a estepe (2009), de Pepetela; O livro dos rios (2006), O livro dos guerrilheiros (2009), de Luandino Vieira. Seguem-se perfis analíticos-interpretativos, feitos a partir da leitura cerrada, de 28 personagens de Callado, 18 personagens de Pepetela e oito personagens de Luandino Vieira, e as conclusões que essas cinquenta figuras nos sugeriram.
Entre dois mundos: a loucura feminina nos romances A Louca de Serrano, de Dina Salústio, e O alegre canto da perdiz, de Paulina Chiziane
A literatura de autoria feminina nas sociedades pós-coloniais é considerada por Gayatri C. Spivak um processo metonímico da saga das mulheres usado como ferramenta de denúncia, que possibilita a quebra de mitos e preconceitos há muito reforçados pelo discurso patriarcal. Dentre as mulheres que encontraram sua voz e se fizeram ouvir, deixando de ser consideradas apenas informantes nativas das histórias orais de sua cultura, merecem destaque as cabo-verdianas Dina Salústio, Vera Duarte, Fátima Bettencourt, Orlanda Amarílis e Dulce Almada Duarte, e as moçambicanas Paulina Chiziane e Lília Momplé. O objetivo desta tese é investigar nos romances A Louca de Serrano e O alegre canto da perdiz, de Dina Salústio e Paulina Chiziane, respectivamente, como se constrói a temática da loucura, representada pelas mulheres africanas (e personagens) Louca de Serrano e Maria das Dores (louca do rio), que pode ser compreendida como uma voz carregada de solidão, dor, negação, rebeldia e inconformismo e como marca de resistência à marginalização feminina nas e pelas práticas sociais hegemônicas.
Fragmento, escrita do desastre e testemunhos da desrazão
Esta pesquisa pretende colocar em diálogo, em um movimento de mútua iluminação, parte dos conceitos expostos no livro L\'Écriture du Désastrede Maurice Blanchot e da produção de um grupo de escritores brasileiros, reunidos aqui na forma de uma dita comunidade da desrazão. Partiremos inicialmente dos estímulos em Blanchot para a práticade uma escrita fragmentária que se fará posteriormente presente no desastre e nos testemunhos da desrazão. Estas referências se baseiam, sobretudo, nos pensamentos de dois filósofos alemães: F. Schlegel e F. Nietzsche. Após a visitação da potência do fragmento na escrita iremos diretamente ao levantamento de uma espécie de composição alquímica que parece haver no desastre blanchotiano. Isto será feito na identificação de alguns conceitos que pairam sobre ele, na formação de um corpo, molecularização e substancialização do desastre. Como forma de exemplificação para esta corporificação utilizaremos o filme Hiroshima mon amourde Alain Resnais, marcador de uma fissura no século XX através do acontecimento da barbárie atômica. Reuniremos então, por meio do conceito de comunidadetal qual colocado pelo filósofo francês Jean-Luc Nancy, autores da literatura brasileira que produziram escritos provenientes de estados de desatino, tendo mesmo parte de seus testemunhos registrados durante ou após períodos de internações psiquiátricas. Estes autores serão: Lima Barreto, Maura Lopes Cançado, Torquato Neto, Renato Pompeu e Rodrigo de Souza Leão. Por conta da carga confessional que muitos destes textos apresentam, nos apoiaremos ainda para uma análise mais profunda narelação entre a ficção e o real no pensamento quanto ao testemunho proposto por Jacques Derrida. Buscaremos também vislumbrar como os elementos da alquimia do desastre pairam e operam nestes escritos. Finalmente, veicularemos textualmente o trabalho poético-performático por nós realizado Fukushima mon amour, expositor das diferenças e transmutações dos tempos através da mediação do desastre e da desrazão na arte produzida a partir dos perigos e fantasmas provenientes do acidente nuclear.
A glória e a queda: construção e desagregação do romance na periferia do capitalismo
O presente trabalho visa explorar a forma do romance na periferia do capitalismo no século XX e XXI, tendo como paradigmas dois de seus mais destacados escritores, Alejo Carpentier e Mia Couto. Para tanto, analisa-se aqui as obras Los Pasos Perdidos (Carpentier) e O Outro Pé da Sereia (Couto) à luz da teoria do realismo de György Lukács. O que se deseja demonstrar é: visto que o romance é a epopéia do mundo burguês, autores como Carpentier se valeram do período de desenvolvimentismo industrial no continente latino-americano inserido no crescimento mundial do capitalismo pós-Segunda Guerra (1945-1975) para lançar o conflito entre a afirmação definitiva da modernidade e seu universo pré-moderno: a isto muitos deram o nome de realismo maravilhoso. Por sua vez, em Moçambique, o histórico colonial e a independência tardia na época da crise estrutural do capital (a partir de 1975) determinaram uma frágil afirmação dos padrões sociais burgueses. Tal condição tem conseqüências na produção romanesca de autores como Mia Couto. Entre elas: o maravilhoso aparece como princípio formal, elidindo tensões necessárias ao romance e restringindo assim o alcance de sua ficção.
A questão do Sagrado ou uma forma de pensar o romance \"A varanda do Frangipani\", de Mia Couto
O presente trabalho tece uma análise do romance A varanda do frangipani, do escritor moçambicano Mia Couto, a fim de iluminar as reinvenções operadas pelo autor de aspectos do Sagrado ligado às crenças tradicionais de Moçambique. Apropriando-se e subvertendo o padrão do romance policial clássico símbolo da exaltação da racionalidade europeia , o autor reinventa no âmbito literário animais sagrados, rituais de iniciação e de adivinhação, espíritos de falecidos que convivem com viventes, assim como árvores divinizadas e mostra ao leitor uma visão de mundo e uma forma de existência diversas da eurocêntrica. Com isso, há a iluminação de questões culturais e sociais do país de onde fala Mia Couto, onde a tentativa de esmagamento cultural foi operada por anos de dominação e guerras. Para a realização desta pesquisa, embasamo-nos em autores como Mircea Eliade, Carlos Serrano, José Luís Cabaço, Omar Ribeiro Thomaz, entre outros, com o objetivo de obtermos a consistência teórica necessária a cerca do conceito de Sagrado e de questões sócio-culturais relacionadas a Moçambique e a outros países africanos; apoiamo-nos ainda em autores como Tzvetan Todorov e Ernest Mandel para percebermos o padrão estrutural e um pouco da ideologia ligada ao romance policial clássico e, assim, verificarmos a reinvenção dessa forma em solo moçambicano.
O jogo entre as efabulações fradiquianas
O trabalho proposto tem por objetivo estabelecer e evidenciar as pontes que unem as efabulações fradiquianas, tendo como base as obras Os Mistérios da Estrada de SintraeA Correspondência de Fradique Mendes, de Eça de Queiroz;O Único Filho de Fradique Mendes, de Frederico de Sá Perry Vidal;Nação Crioula, de José Eduardo Agualusa eEsquemas de Fradique, de Fernando Venâncio, procurando comprovarque as efabulações são partes de um todo maior e continuo e que revelam a tentativa de, durante mais de um século, formular possíveis bibliografias para a personagem, Fradique Mendes. Pretende-se, ainda, demonstrar quais são os elementos narrativos que ligam as obras em questão, considerando para isso as intencionalidades autorais e as coerências na constituição dopersonagem.
2013
Eduardo Gonzales Moreira
João Cabral e José Caveirinha: literatura contra a desumanização
Esta tese faz uma análise comparativa entre parte da obra de João Cabral de Melo Neto e João José Craveirinha levando em consideração aspectos como a recorrência da morte, da desumanização, dos discursos irônicos e, por fim, a defesa de territórios - para efeitos deste estudo, também chamada de resistência. São analisados os livros de João Cabral de Melo Neto: Dois parlamentos, Auto do Frade e um trecho do poema Morte e vida severina. Quanto à obra de José Craverinha, analisa-se Babalaze das hienas, Cela 1 e trechos da Ode a uma carga perdida em um barco incendiado chamado Save, do livro Xigubo.
2017
Maria Nilda de Carvalho Mota
Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra e Antes de nascer o mundo: uma leitura da experiência da vida nos percursos de Marianinho e Mwanito
Esta dissertação realiza uma leitura em perspectiva comparatista entre os romances do autor moçambicano Mia Couto Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra e Antes de nascer o mundo. A partir das oscilações espaciais das personagens centrais Marianinho e Mwanito, que transitam entre campo e cidade, realiza-se uma leitura de tais espaços considerando as imbricações entre a ficção de Mia Couto e a realidade moçambicana. Para este estudo, apoiamo-nos em vários autores, como José Luís Cabaço, que nos abriu o horizonte a respeito dos processos sócio-históricos que envolvem a realidade moçambicana atual, Mikhail Bakhtin, Georg Lukács, Walter Benjamin e Theodor Adorno, que nos embasaram crítica e teoricamente e Antonio Candido, que norteou as reflexões acerca dos aspectos sociais que envolvem a literatura. O trabalho aborda ainda a maneira como os jovens Marianinho e Mwanito podem representar a constituição de uma nova identidade moçambicana, permeada pelas tensões entre colonizado e colonizador, tradição e modernidade, campo e cidade, entre outros pares dicotômicos.
Figurações da Lunda: experiência histórica e formas literárias - Um estudo sobre ethnografia e história tradicional dos povos da Lunda (expedição portuguesa ao Muantiânvua, 1884-1888), de Henrique de Carvalho, Lueji e Ilunga na terra da amizade , de Castro Soromenho e Lueji- o nascimento dum império, de Perpetela.
A perspectiva deste trabalho será a de que as diferentes experiências históricas de Henrique de Carvalho (Expedição Portugueza ao Muantiânvua: Ethnographia e história tradicional dos povos da Lunda- 1884-1888) (1890), Castro Soromenho (Lueji Ilunga na terra da amizade) (1945) e Pepetela (Lueji: o nascimento dum império) (1989) definem a forma literária, respectivamente, literatura de viagem, um conto tensionado e um romance. Três formas literárias distintas que mantêm o elo com o texto historiográfico, pois Castro Soromenho e Pepetela se apropriam do texto de Henrique de Carvalho para elaborarem seus enredos centrais que giram em torno do espaço Lunda. Tendo em vista que tal espaço potencializa as três narrativas, levaremos em conta que \"A forma não pode ser compreendida independentemente do conteúdo, mas ela não é tampouco independente da natureza do material e dos procedimentos que este condiciona. A forma depende, de um lado, do conteúdo e, do outro, das particularidades do material e da elaboração que este implica.\" (Bakhtin, M. 1992, p. 206)
Cooperifa e a literatura periférica: poetas da periferia e a tradição literária brasileira
Trataremos neste trabalho da poética surgida a partir da produção literária e do sarau da COOPERIFA (Cooperação Cultural da Periferia). Por meio das análises dos poemas advindos desse movimento cultural, verificaremos a contribuição dessa produção à Literatura Brasileira e ao cenário cultural que favorece o surgimento de escritores oriundos dos espaços historicamente marginalizados pelos contextos culturais e sociais hegemônicos brasileiros.
Minsk e Dois Dedos da prosa insone de Graciliano
A nossa intenção neste trabalho é situar o escritor Graciliano Ramos em um contexto de estudo onde se observe dois de seus contos publicados em Insônia (1947): Minsk e Dois dedos. Sendo que o conto Minsk teve versão publicada também para crianças (2013). A proposta justifica-se por ser Graciliano Ramos autor representativo da literatura brasileira, conhecido e estudado em países de língua portuguesa, amplamente pesquisado nos meios acadêmicos. Os dois contos, bem como outros textos escritos por Graciliano, sua obra, de maneira geral, servirão como corpus para que possamos verificar o escritor nordestino em um universo diferente daquele em que foi consagrado: o dos romances. Ao considerarmos as relações dinâmicas que se estabelecem entre autor, texto e leitor, e sabendo que o escritor, ao elaborar o seu trabalho, o faz submetido a uma intenção criativa e a um propósito estético, ideológico e social, cônscio da necessidade de buscar efeitos de sentido, transmitir o seu pensamento e incitar interpretações, tentaremos responder a uma questão que nos parece fundamental: seria mesmo a necessidade de conseguir transformar rapidamente seus textos em dinheiro o que teria feito Graciliano abandonar os romances depois de solto, em janeiro de 1937? Há uma tendência de se atribuir à necessidade de sustentar a família, o fato dele escrever contos e textos curtos, publicáveis em jornal, com o objetivo de rapidamente obter pagamento por eles. Tal prática teria feito Graciliano Ramos abdicar dos trabalhos de maior fôlego. Vidas secas, por exemplo, romance publicado em 1938, já seria uma obra fragmentada, nascida de contos anteriormente lançados em periódicos. Com este objetivo, analisaremos Minsk e Dois dedos, interpretando as vozes subjacentes que reverberam além do texto, e observando os contextos que permitem considerar o livro em questão em que estão inseridos (Insônia) como obra canônica de nossa literatura. Ao migrar de romancista para contista, cronista, produtor de escritos mais sintéticos, Graciliano estaria à vontade e exercendo o ofício de escritor em sua plenitude, ou a necessidade prática de subsistência estaria desperdiçando seu talento? Para isso procuramos fazer uma abordagem mais ampla de seus contos, focando particularmente, em Dois dedos e Minsk, como já dissemos, observando também sua versão infantil, buscando sua relação histórica com a escola, a sua contemporaneidade, as questões culturais que envolvem o autor, bem como o seu pensamento como escritor.
2020
Ricardo de Medeiros Ramos Filho
Violência e práxis na literatura infantil e juvenil: uma análise comparativista
Este presente trabalho visa a analisar, sob a ótica da Literatura Comparada, a temática da violência em obras de literatura infantil e juvenil. Além da teoria literária comparativista, usaremos também as teorias de discurso e dialogismo bakhtinianas e o conceito de prática social, apresentada na obra do lingüista Izidoro Blikstein. Nosso objetivo primordial é observar como a prática social, ou práxis, influencia o tratamento do tema da violência em obras de literatura infantil e juvenil. A escolha do tema de pesquisa se deu em função da crescente discussão sobre a presença de elementos violentos nos meios de entretenimento e arte infantis. Na escolha do corpus, procuramos abranger épocas diferentes, para que fosse possível analisar como a práxis de cada período influencia o tratamento temático nos textos infantis e juvenis. Assim, do século XIX, temos Sofia, a desastrada e Meninas Exemplares, da Condessa de Ségur. Do século XX, selecionamos Sangue Fresco, de João Carlos Marinho e do século XXI, De Mãos Atadas, de Álvaro Cardoso Gomes.
A palavra (re)inventada: pelos caminhos da harmonia e da violência (uma leitura de estórias de João Guimarães Rosa e José Luandino Vieira)
O trabalho ora apresentado tem como proposta a leitura, sob o pondo de vista comparatista das estórias presentes em Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa, publicado pela primeira vez em 1962, e No antigamente, na vida, de José Luandino Vieira, de 1974. Parte-se do mapeamento do percurso da (re)invenção inscrita no tempo da infância, para posteriormente, sob o recorte da caracterização das personagens infantis, verificar a ficcionalização da violência através destas personagens, marcadas por dois movimentos distintos: através da compreensão da presença ou do passado colonial e das identificações nacionais, do intento harmonizador, em Guimarães Rosa, e da evidenciação da violência, temática e estruturalmente, em Luandino Viera.
Dos rios e suas margens: narrativas e pensamento socioambiental na produção literária de Davi Kopenawa e de Mia Couto
Este trabalho realiza uma leitura das narrativas de A queda do céu: palavras de um xamã yanomami, de autoria de Davi Kopenawa e Bruce Albert, e Pensatempos: textos de opinião e E se Obama fosse africano? e outra interinvenções: ensaios, de autoria de Mia Couto, destacando as relações entre literatura e as questões socioambientais. Para tanto, propõe um exercício comparativo e transdisciplinar de análise do corpus, estabelecendo diálogos entre os campos dos estudos literários, da antropologia, da história, o que constitui um processo interpretativo das realidades traduzidas nos textos em estudo. Em diálogo com um referencial teórico heterogêneo, foi possível identificar estratégias de intervenção político-discursivas em textos que desafiam as fronteiras entre a realidade e a ficção, enfatizando a ameaça e as consequências do avanço da degradação ambiental em escala planetária. Frente a isso, os resultados encontrados indicaram que as narrativas de Davi Kopenawa e de Mia Couto evidenciam, de formas distintas, a construção de um pensamento socioambiental marcado pela confluência de aspectos sociais, econômicos, ambientais e culturais ancorados em experiências históricas vividas e/ou observadas no Brasil e em Moçambique, elaborando respostas críticas à imposição violenta e destrutiva do sistema capitalista.
2021
José Welton Ferreira dos Santos Junior
Cálculo, prestígio e interesses: o amor em outra perspectiva na ficção de Camilo Castelo Branco e Manuel Antônio de Almeida
O século XIX, período marcado pelo processo de ascensão da burguesia em Portugal, caracterizou-se também pelos arranjos matrimoniais, que passaram a priorizar as questões financeiras em detrimento dos valores de sangue. Camilo Castelo Branco, assim como muitos escritores do período, não prescindiu de discorrer criticamente acerca desse tema em sua obra. Nos romances Aventuras de Basílio Fernandes Enxertado, Eusébio Macário e A corja, o autor engendra personagens que empregam estratégias arrivistas, a fim de conquistar burgueses de fortunas recentes, construídas, sobretudo, por meio do trabalho no Brasil. Nessas narrativas, para uma burguesia vitoriosa, as uniões matrimoniais priorizam menos o sentimento amoroso que o primado do dinheiro, tornando-se, assim, resultado de cálculos e interesses. Também em meados do século XIX, Manuel Antônio de Almeida, publicava, no Brasil, Memórias de um sargento de milícias. Não há, no conteúdo das obras, referências explícitas entre elas, mas as similaridades dos temas que as perpassam nos permitem desenvolver um trabalho de veio comparatista. Assim como nos romances camilianos, na narrativa brasileira, o casamento financeiramente vantajoso surge como meio de mobilidade em uma sociedade em que a ascensão social por meio do trabalho era dificultada pelos problemas socioeconômicos. A partir do diálogo com a tradição picaresca de origem espanhola, o autor brasileiro também mostra seus personagens recorrendo a subterfúgios arrivistas para alcançar o casamento que viabilize o enriquecimento. Nesse sentido, nos romances estudados nessa tese, percebe-se um diálogo dos autores com a História de seus respectivos países, pois no decurso da narrativa, ao passo em que acompanha os eventos que irão culminar nos enlaces planejados pelos personagens, o leitor pode perceber alguns aspectos da estrutura social do Brasil e Portugal oitocentista implicando na estrutura da obra.
2015
Tatiana de Fatima Alves Moyses
Identidades imaginárias: um estudo comparado do livro A máquina de fazer espanhóis, de Valter Hugo Mãe, e do filme Terra estrangeira, de Walter Salles e Daniela Thomas
O romance de Valter Hugo Mãe, A máquina de fazer espanhóis, traz à tona a discussão sobre a fragmentação de identidade do povo português, revelando o mal-estar nacional perante a situação socioeconômica do país no período pós-Salazar e diante do contexto da globalização neoliberal, bem como a relação de Portugal com os blocos hegemônicos de poder e ex-colônias. O filme Terra estrangeira, dos cineastas Walter Salles e Daniela Thomas, dialoga com o cenário de globalização da obra de Mãe e sugere uma reflexão sobre a fragilidade de identidade dos brasileiros durante o Governo Collor, abordando o fenômeno da emigração para a Europa. Trabalhando com a comparação entre as obras, sobretudo de seus momentos históricos e as diferenças de enfoque narrativo, este projeto visa discutir as relações entre identidade nacional e representação da História pela literatura e cinema.